GOVERNO DO ESTADO DO PIAUÍ
INSTITUTO DE REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA E PATRIMÔNIO IMOBILIÁRIO DO PIAUÍ – INTERPI-PI
Diretoria de Povos e Comunidades Tradicionais – INTERPI-PI
INTRODUÇÃO: O Relatório de Identificação e Delimitação do Território Tradicional da Comunidade Quilombola Mucambo, com processo no INTERPI nº 00071.003501/2021-47, daqui para diante chamado RIDT, foi elaborado por equipe do INTERPI sob a responsabilidade técnica da Cientista Social, Consultora/INTERPI, Antonia Maria Alves Lima e a parte agroambiental foi elaborada pela engenheira agrônoma, também consultora/INTERPI, Simone Raquel Mendes Oliveira. O presente resumo foi elaborado por Antonia Maria Alves Lima. No RIDT, a Comunidade Quilombola Mucambo descreve o seu ambiente e a sua história, se situando como remanescentes das comunidades dos quilombos, certificada como tal, pela Fundação Cultural Palmares, e autodeclarada no documento de consulta registrada em ata inserida no processo/SEI nº 00071.003501/2021-47, Id: 7614946.
BASE LEGAL: O trabalho apresentado tem como base legal o disposto no Artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT)` da Constituição Federal de 1988, que garante aos remanescentes das comunidades dos quilombos a titulação de seus territórios; Fundamenta-se ainda no que preconiza a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário. O trabalho também toma como base a legislação própria do Estado do Piauí: Lei Estadual nº 5.595/2006, no Decreto Estadual nº 14.625/2011 que regulamenta a Lei 5.595/2006; na Lei Estadual nº 7.294 de 10 de dezembro de 2019 que dispõe sobre a política de regularização fundiária do Estado do Piauí e decreto estadual nº 22.407, de 12 de setembro de 2023 que regulamenta a Lei nº 7.294/2019.
MARCO TEÓRICO: Como núcleo básico dos temas abordados no RIDT e bibliografia correlacionada, têm-se concepções de quatro categorias principais: Comunidade tradicional, Etnicidade, Identidade e Território, que se interligam entre si. Tais categorias são abordadas e relacionadas sob a perspectiva de diversos autores: ALMEIDA, A. W. (2002, 2004); LITTLE, Paul E. (2002); OLIVEIRA, R. C. (1976), CLIFFORD, J. A (1988); BOAVENTURA (2005) e BRASIL (Constituição Federal (1988)).
METODOLOGIA: A construção do RIDT foi feita através do diagnóstico participativo rural (DRP), com uso de técnicas de levantamento de dados coletivos e individuais através de oficinas e entrevistas. Para essa construção foram utilizados vários momentos como reunião de consulta informativa e discussão sobre a delimitação do território; levantamento de campo (dados primários), além do georreferenciamento e cadastramento (Id: 011531622) das famílias que também subsidiam o RIDT . Os dados secundários foram obtidos a partir de pesquisa bibliográfica e pesquisas em sites de instituições públicas como IBGE e outros.
AMBIENTE: A comunidade quilombola Mucambo está situada na data Arroz, na região do semiárido, de bioma caatinga apresentando temperaturas elevadas, baixa amplitude térmica e chuvas escassas e mal distribuídas, com longos períodos de estiagem. A comunidade pertence territorialmente ao município de Queimada Nova, que compreende uma área total aproximada de 1.283,369 km² (IBGE/2022), tendo como limites os municípios de Paulistana e Acauã ao norte, ao sul com Lagoa do Barro do Piauí e o estado de Pernambuco, a Leste com o estado de Pernambuco e, a oeste com Lagoa do Barro do Piauí. Queimada Nova se situa a cerca de 522 km da capital, Teresina.
COMUNIDADE QUILOMBOLA MUCAMBO: De acordo com os relatos, a história da comunidade tem início com José Ricardo Nascimento e seu pai que, moravam na comunidade Carissó, uma localidade que se limita com a comunidade quilombola São Martins, em Paulistana. No final da década de 30, adquiriram a posse dessas terras do Mucambo, de um Fazendeiro do Capim (comunidade próxima ao Mucambo). Porém, devido à falta de água e o local ser inóspito não o ocuparam, imediatamente e continuaram morando em Carissó. Segundo a narração, José Ricardo era casado com Cristina Josefa e tinham os filhos Cirila e Valério. Viviam também em Carissó o casal Germano José Martins e Francisca Josefa da Conceição, pais de senhor Paulino Germano Martins, um dos mais idosos da comunidade Mucambo. Segundo o seu Paulino, quando sua mãe faleceu, seu pai Germano casou com Cirila, filha de José Ricardo que, por volta da década de 60, convidou o Germano para, junto com Valério (filho de José Ricardo), “tocassem” as terras do Mucambo. A princípio passavam um tempo fazendo roça e depois voltavam para Carissó, De acordo com senhor Paulino, no ano 1964, abriram as roças e ficaram acampados embaixo do pé de juazeiro. Declarou ainda que ele foi o primeiro a ficar morando na comunidade, em tendas. “Eu, Leocádia com Isaias ficamos morando na localidade por três anos até virem os outros”. De acordo com os relatos, a maior dificuldade sempre foi a falta de água, por isso, inicialmente só trabalhavam em época de chuva. Depois que resolveram morar, buscavam água nas terras de uma senhora chamada de Josefa Raimunda dos Anjos, que veio a ser sogra do senhor Paulino e ofertou água de uma cacimba. Segundo senhor Paulino, duas vezes ao dia (manhã e tarde) faziam o percurso de quatro quilômetros para pegar água numa cangalha (jumento). Na localidade Mucambo existe a área ocupada por famílias que se autodeclaram quilombolas e outra parte ocupada por famílias que não se autodeclaram quilombolas que eles chamam de “mucambo de riba”, cujas famílias já viviam na localidade quando José Ricardo adquiriu o primeiro pedaço de terra no Mucambo. Assim, há o “mucambo de riba” que são terras que pertencem à famílias que não se autodeclaram quilombolas (brancos) e o “mucambo de baixo” que corresponde a área do quilombo Mucambo. Apesar de, ao longo do tempo, ter havido a mistura de moradores do “mucambo de baixo” com os de “mucambo de riba”, observa-se que as famílias que vivem no “mucambo de riba” não se autodeclaram quilombolas. Portanto, o território indicado pela comunidade corresponde apenas à essas terras adquiridas e trabalhadas por José Ricardo e Germano e seus descendentes. Observa-se que as duas famílias que iniciaram a exploração da terra (Nascimento e Martins), tem ancestralidade e parentesco com famílias de outras comunidades (quilombolas) da região, apontando para a existência de mais de 200 anos. E, na localidade Mucambo misturou-se à família dos Anjos, sendo essas três famílias a base de toda a população da comunidade que possuem relação de parentesco entre si. Observou -se a resistência de manifestações culturais como a presença de rezadeira e benzedeira e do sincretismo religioso. Existem na comunidade 23 famílias e 67 pessoas. A maioria das casas da comunidade é feita de adobe, cobertura de telha de barro e piso de cimento. Poucas residências possuem banheiros. A comunidade possui estradas carroçais que consideram regular, mas em época de chuva tem trechos que ficam intransitáveis. O principal transporte utilizado pelos comunitários é a motocicleta, mas há um veículo (pau-de-arara), que faz linha toda segunda feira para Queimada Nova. A energia elétrica chegou à comunidade por volta de 2007, através do programa Luz para Todos. A água sempre foi a maior dificuldade. Na atualidade utilizam-se de cisternas e, apesar de ter poços suficientes, a água é salgada não servindo para o consumo humano. A comunicação se dá através de wifi. Com relação à saúde, devido à distância da cidade, reclamam da dificuldade de acesso. Com relação à educação, a escola de ensino fundamental fase 01 e 02 fica na comunidade vizinha, mas apontam a dificuldade de acesso ao ensino médio e superior. Todos se declaram católicos e alguns pessoas praticam a umbanda em paralelo. Em 2007 fundaram a associação do quilombo Mucambo, que funciona regularmente. A maioria das famílias pratica a agricultura de subsistência com os cultivos de milho, feijão, mandioca, macaxeira, amendoim, cana, fava, batata, entre as frutíferas destacam-se a manga, goiaba. As hortaliças que se destacam na Comunidade são: coentro, cebolinha, alface, cenoura, beterraba produzidas nos canteiros (suspensos ou no chão). A produção animal caracteriza-se, predominantemente, pela presença de caprinos e ovinos, apesar de se observar que algumas famílias possuem suínos e pequena quantidade de cabeças de gado. A produção é utilizada, prioritariamente, para o consumo, porém algumas famílias conseguem comercializar o excedente da produção de ovelhas.
DELIMITAÇÃO E CONCLUSÃO: O território quilombola Mucambo situado no município de Queimada Nova, no Piauí, apresenta uma área total de 333,7445 ha e perímetro de 11.558,00 m. Essa área total está dividida em três partes: Território Quilombola Mucambo Área 01, medindo 266,0476 ha e Perímetro: 7.215,79 m; Área 02: 36,9709 ha 3.559,49 m e Área 03: 30,4643 ha e Perímetro: 3.712,64 m. O mapa e respectivo memorial descritivo do perímetro e da área do território reivindicado pelos remanescentes das comunidades dos quilombos tem como responsável técnico o Engenheiro Agrimensor Eduardo George dos Santos Silva. CREA 11909825247/PI, os quais estão inseridos no processo/INTERPI nº 00071.003501/2021-47, ids: 012883096 e 012883127, respectivamente e seguem anexado a esse documento.