RESUMO DO ESTUDO ANTROPOLÓGICO
COMUNIDADE CABECEIRA DO RIO, GILBUÉS/PI.
INTRODUÇÃO: A comunidade tradicional de Cabeceira do Rio se situa no limite que divide os
municípios de Gilbués e Santa Filomena, localizadas no sudoeste do Estado do Piauí, estando uma
parte do território em cada um dos municípios, a linha que divide os municípios também dividindo o
território em duas metades (pág. 03). Teve processo instaurado por meio da portaria nº
394/2020/DG/INTERPI em 21/11/2020 (ID 0880240) e publicação do diário oficial do Estado no dia
7 de abril de 2021, nº 68, à pág. 32 (ID 1395921). O processo de regularização fundiária da comunidade
tradicional de Cabeceira do rio tramita sob o processo nº 00071.009231/2020-05. Estes estudos de
identificação e delimitação vêm sendo realizado em comunidades dos municípios da região do
Matopiba fazendo parte de um conjunto de ações realizadas pelo Governo do Piauí, que irá subsidiar
intervenções do subcomponente de Regularização Fundiária, integrante do “Projeto Piauí: Pilares do
Desenvolvimento e Inclusão Social” (Pág.03). Para tanto, foi contratada empresa DEMACAMP, no
âmbito do contrato 064/2020, que trata da contratação de consultoria para elaborar estudo
antropológico de identificação territorial e de caracterização socioeconômica de comunidades
tradicionais nos municípios piauienses da região do Matopiba. Na comunidade Cabeceira do Rio
residem 25 famílias, este é também o número de habitações permanentes, num número aproximado de
72 pessoas, entre adultos e crianças. Há ainda o indicativo de três famílias que irão residir no território
cujos lugares das casas já estão indicados no mapa que se encontra na conclusão deste relatório
(pág.03). A realização do estudo aconteceu em dois momentos distintos, no período de 02 a 13 de
dezembro de 2020 e de 07 a 15 de março de 2021, obedecendo as indicações de distanciamento social
como medida preventiva da COVID-19 (pág.04). Assim, o objetivo do estudo antropológico realizado
é de identificar as especificidades na forma de viver e se reproduzir na Comunidade Cabeceira do Rio,
caracterizando a relação econômica, física, histórica e simbólica dessa comunidade com o território
que ocupa (pág.05).
BASE LEGAL: O Estado do Piauí, sobretudo a região sul do Estado, onde se encontram a região do
presente estudo, passou pelo processo de “regularização dos usos do solo e que tem suas ascendências
remontáveis ao século XVII” (ARAÚJO, 2020, p.69). De modo que devido ao processo de colonização
e dizimação de “povos originários do sul do Estado, a exemplo dos Gurgueia e Akroá” (PUNTONI,
2002). Mudou toda a configuração de uso da terra, assim em 2015, a fronteira agrícola em consolidação
e agora conhecida como Matopiba ganhou amparo do Estado brasileiro por meio do Decreto n.º 8.447,
de 6 de maio de 2015, que passou a dispor sobre o chamado Plano de Desenvolvimento Agropecuário
do Matopiba (PDA – Matopiba), (pág.07). Ante, o exposto, tem-se registrado uma série de
entrechoques recentes de interesses e lógicas díspares de ocupação territorial nas hinterlândias rurais
desses estados. Como detalha o mais recente Relatório FIAN Internacional & Comissão Pastoral da
Terra (CPT), deflagra-se, especialmente na região sul do Piauí, um conjunto de conflitivas que
tencionam, de um lado, as demandas coletivas das comunidades tradicionais em suas persecuções pela
garantia do direito da habitação e da subsistência e, do outro, os representantes do capital agropecuário
de larga escala, em suas medidas de aquisição de bens fundiários e projetos especulativos no garimpo,
na agroindústria e no mercado de terras (cf. Relatório FIAN Internacional/ Comissão Pastoral da Terra
– CPT, 2018). (pág.07). Diante disso, o Estado do Piauí criou dispositivos na regularização fundiária
que beneficiam Povos e Comunidades Tradicionais ao dispor sobre a regularização das ocupações
exercidas sobre terras públicas e devolutas pertencentes ao Estado do Piauí, com a recente
promulgação da Lei nº 7.294, de 10 de dezembro de 2019. A Lei definiu os Territórios Tradicionais
para a sua atuação e previu a titulação de tais territórios em proveito das Comunidades Tradicionais,
de Povos Indígenas de Comunidades Quilombolas, conforme dispõe no seu art.3º, inciso X “Territórios
tradicionais: os espaços necessários à reprodução cultural, social e econômica dos povos e
Comunidades Tradicionais, sejam eles utilizados de forma permanente ou temporária, observado, no
que diz respeito aos povos indígenas e quilombolas, respectivamente, o que dispõem o art. 231, da
Constituição Federal, e o art. 68, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, e demais
regulamentações” (pág.07). No que se refere à transferência de dominialiadade, Povos e Comunidades
Tradicionais podem ter acesso aos seus territórios, dispõe o art. 11, parágrafo único, da Lei 7.294/19
“Serão destinadas às comunidades indígenas, quilombolas e tradicionais as terras públicas e devolutas
estaduais por elas ocupadas coletivamente, as quais serão regularizadas de acordo com as normas
específicas, aplicando-se lhes, no que couber, os dispositivos desta Lei” (pág.08). Ainda, a Lei nº
11.284/06 indica o privilégio da assistência de suas demandas em diante das intercorrências de litígios
com particulares, conforme indica o art. 15 da referida lei “Em caso de conflito nas regularizações de
ocupações incidentes em terras devolutas ou públicas estaduais de que trata este Capítulo, o Estado
priorizará a regularização em benefício das comunidades locais, definidas no inciso X do art.3º, da Lei
nº 11.284, de 2006, se o conflito for entre essas comunidades e particular, pessoa física ou jurídica”
(pág.08). Assim, “as ruralidades e o fenômeno fundiário que atrelam a dispositivos legais como esses
e às ações de políticas públicas empreendidas pelo INTERPI de forma alguma parecem isolar os
impactados por essas iniciativas na condição genérica de “produtor rural”. (pág.08).
MARCO TEÓRICO E METODOLOGICO: A identidade das comunidades tradicionais está
relacionada diretamente aos grupos dos quais pertencem. Neste sentindo, o presente estudo aborda
conceitos definidos pelo O’Dwyer (2011) que destaca ser comum que o reconhecimento dos territórios
que ocupam essas comunidades, designando os lugares antigos e atuais, seja caracterizado pelo uso de
nomes próprios ou de outros termos que fazem sentido para o grupo, e que isto seria um indicativo do
processo de territorialização do grupo. Aponta discussão feita por Barth (1998) que trata das fronteiras
étnicas, pontuando a importância para os limites que são estabelecidos pelos próprios grupos,
indicando quem pertence e quem não pertencem ao grupo, são fundamentais nas discussões acerca das
comunidades tradicionais uma vez que esses limites não são fixos (pág.08). No que refere a etnicidade
é utilizado o princípio das “identidades contrastivas” adotadas por Fredrik Barth (1969) e
posteriormente desenvolvido teórico e etnograficamente por Roberto Cardoso de Oliveira (1996),
através dos seus casos de aproximação interétnica em que “um nós e um ele relacional” ordenam suas
co-elaborações dentro dos limites fronteiriços dos seus territórios e dos seus caracteres culturais
(pág.09). Quanto a territorialidade Little (2002) aponta que esta se dá como o esforço coletivo de um
grupo social para ocupar, usar, controlar e se identificar com uma parcela específica de seu ambiente
biofísico, convertendo-a assim em seu “território”. Na mesma trilha de Little, Godoi (2014) aponta
que a territorialidade é plural e que diz respeito a processos de construção de territórios, processos de
apropriação, controle, usos e atribuição de significados sobre uma parcela do espaço, que é
transformada em território (pág.09).Reitera Little (2002), o fato de que um território surge diretamente
das condutas de territorialidade de um grupo social implica que qualquer território é um produto
histórico de processos sociais e políticos (pág.09). Importante destacar que a partir de uma abordagem
histórica, todo o processo de ocupação desse espaço físico, construído como território ao mesmo tempo
em que se constroem como um coletivo (pág.10). No que se refere a metodologia , a investigação levou
em consideração os processos de transformação e flexibilidades presentes no território e na
comunidade investigada. E em razão da ausência de trabalhos de pesquisa sobre a comunidade, a
pesquisa contou com a história oral como estratégia de coleta de dados, na qual a partir de relatos dos
mais velhos foi possível abordar o histórico da comunidade e da ocupação do território, contando ainda
com os relatos dos mais jovens para compreender novas territorialidades. Foram realizadas, também,
entrevistas com os moradores visando coletar dados sobre a ocupação atual do território e as atividades
econômicas desenvolvidas (pág.10). O trabalho utilizou a observação direta como base da descrição
densa nos moldes propostos por Geertz (2012), que considera o homem como um animal amarrado a
teias de significados que ele mesmo teceu (pág. 11). A adoção da observação direta levou em
consideração que, muitas vezes, vale mais a pena escutar os nativos do que interrogá-los (WEBER,
2009), não somente para ouvir suas próprias classificações, mas também para evitar receber as
respostas que não seriam senão o espelho das questões e das expectativas do pesquisador.
AMBIENTE: A comunidade tradicional de Cabeceira do rio está localizada entre dois municípios
Gilbués e Santa Filomena, no sudoeste do Estado do Piauí, mas precisamente na região do Matopiba
que é considerada a última fronteira agrícola brasileira, resultante da expansão do agronegócio, é uma
região predominante de áreas de cerrado, estima-se que cerca de 11,5 milhões de hectares do Estado
do Piauí são de cerrado, concentrando na região sudoeste, ou seja, onde a Comunidade Cabeceira do
rio se encontra (pág.12). A Comunidade Cabeceira do Rio se localiza em terras de menor altitude entre
duas serras (terras de maior altitude) (pág.13). Quanto ao solo da região, são provenientes de arenitos,
saltitos, folhelho, conglomerado e calcário, já a vegetação é de fase cerrado tropical subcaducifólio,
mata de cocais (pág.14). Precisamente no município de Gilbués possui clima tropical sub-úmido (
ausência de aridez) com pluviosidade em torno de 1.200 mm/ano, com a presença de rios perenes e
aquíferos, e embasamento sedimentar, solos profundos constituídos de argila e areia, domínio do Cerrado,
chapadas, morrotes e rampas longas como principais feições geomorfológicas (pág.15). A região que
compreende a comunidade tradicional de Cabeceira do rio é Área de Proteção Ambiental de acordo com o
Decreto Estadual nº 17.431/17 que determinou que as “ Nascentes do Rui Uruçuí-Preto” como grupo de
uso sustentável, assim estabelecendo uma Unidade de Conservação (pág.15). Sobre vegetação da área da
bacia hidrográfica do Rio Uruçuí-Preto é bastante diversa, assim é comum uma comunidade de vegetal
típica das savanas, com elementos arbustivos e arbóreos, com troncos tortuosos, casca espessa, folhas
cariáceas, etc. As espécies mais frequentes nesta região são o barbatimão, o pau terra de folha larga e a
simbaíba, e a superfície do solo é recoberta por um estrato graminoso de capim agreste. Já entre o topo das
chapadas e o trecho plano por onde corre o Uruçuí Preto, o cerrado se desenvolve de forma mais fechada,
sendo composto por espécies de maior porte, como por exemplo o pau d’árco (pág.16).
OCUPAÇÃO HISTÓRICA E ECONÔMICA DA REGIÃO: A ocupação do Piauí ocorreu
diferente das demais regiões do Brasil, seu povoamento e colonização começou do interior para o
litoral, assim “teve início a partir do Rio São Francisco quando chegaram as primeiras expedições a
procura de mão-de-obra indígena e de metais preciosos, isso em meados do século XVII” (pág.16).
Com forte influência da Casa da Torre na Bahia, e com a implementação da economia pecuária no
sertão, com a propagação de sesmarias e a formação de fazendas de gado. “A partir daí, os
colonizadores começaram a expandir seus currais rumo aos vales dos rios Gurguéia, Canindé e
Parnaíba” (ALVES, 2003) (pág.16). Os irmãos Mafrense foram os responsáveis pela colonização do
Piauí, no entanto, assim que asseguraram o título das terras e disseminaram fazendas de gado,
retornaram à Bahia, fixando residência em Salvador, sendo as fazendas administradas pelos vaqueiros,
figura típica e que perdura aos dias atuais em todo o Sertão nordestino, assim diferente de outras
regiões, aqui predominava a atividade criatória (pág.16). Segundo Oliveira (2007) “constatou-se a
existência de 129 fazendas de gado e 153 sítios às margens dos rios e lagos” (pág.17). Os autores
acreditam que não havia uma preocupação com o desenvolvimento ou modernização da região aquela
época, o que acabou por revelar um caráter secundário da economia da região, servindo apenas como
atividade complementar à produção da cana-de-açúcar e posteriormente à mineração (pág.17). A
concentração de terras a partir do século XVIII foi a grande responsável por conflitos entre sesmeiros
e posseiros que trabalhavam e viam na terra ( OLIVEIRA, 2007). Ainda, de acordo com Rufo Sobrinho
(2015) a pecuária extensiva, base da economia piauiense, naquele momento foi capaz de criar uma
classe média, resultando numa dependência de outras capitanias em outras atividades, tais como
comércio e agropecuária (pág.17). Houve um declínio na atividade pecuária piauiense, muito pela
ausência de conexão entre as fazendas e inexistência de centros urbanos consolidado, contribuindo
para uma maior dependência dos centros urbanos localizados em outros Estados (RUFO, 2013). Alves
(2003) destaca um ponto importante na ocupação do Piauí, que era direcionada pela água, foram os
cursos d’água que constituíram o mais importante fio condutor do povoamento do Piauí, foi nas
proximidades deles que se instalaram os sítios, as fazendas de gado e a maioria das aglomerações
urbanas. E foi em torno deles que se definiram certas características da formação territorial piauiense,
cujas marcas permanecem ainda nos dias de hoje, na medida em que uma parcela significativa do povo
piauiense ainda organiza seu espaço de morada e de trabalho nos fundos de vales úmidos (pág.19).
Uma nova dinâmica de ocupação econômica do sudoeste piauiense tem início por volta dos anos 1970
com a instalação de grandes empreendimentos agrícolas, num movimento de exploração do cerrado.
Segundo Rufo Sobrinho (2015), a nova dinâmica de ocupação da região sudoeste do Piauí se deu
especialmente com a modernização agrícola iniciada na década de 1970 e que se intensificou no fim
dos anos 1990, fruto da migração dos chamados “gaúchos”, de origem principalmente dos estados do
Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, São Paulo e Mato Grosso. O Estado do Piauí se insere no
processo de modernização agrícola, incentivado e implantado pelo governo brasileiro nos anos 1970,
marcado pela ocupação dos cerrados objetivando a modernização de áreas de economia agropecuária
estagnadas no território brasileiro (pág.20). Nos anos 90 se caracteriza por uma ausência de políticas
públicas que viabilizassem o desenvolvimento do nordeste, mas apesar disso, são criados programas
de incentivo ao desenvolvimento, o que atraiu ainda mais imigrantes do sul, cujo governo estadual deu
todo incentivo, estes se fincaram primordialmente na região compreendida do cerrado piauiense
(pág.20). Esse novo processo que foi chamado de modernização refletiu em alterações no espaço e nas
formas de produção da agricultura da região do sul do Piauí (pág.21).
HISTÓRICO DA COMUNIDADE: A ocupação do território denominado Cabeceira do Rio se deu
em diferentes momentos e de forma gradual. Ele foi se constituindo à medida que as famílias foram
chegando, migrando de diferentes lugares e comunidades em busca de um lugar para morar e trabalhar.
O histórico da comunidade é descrito a partir das histórias e trajetórias dos moradores (pág.22). Assim,
em algumas trajetórias é possível perceber que suas vidas são também marcadas pelo curso do rio
Uruçuí-Preto, uma vez que sempre viveram em suas proximidades, tendo nos brejos sua principal fonte
de sustento, seja para o cultivo de suas roças, suas atividades de coleta ou ainda para a criação de seus
animais (pág.22). A comunidade começou a ser ocupada com a chegada de seu Assis, sua mãe e sua
esposa à época, sendo sua primeira morada o lugar chamado brejo do braço, quando chegaram na
fazenda não havia nenhuma estrutura, havia apenas uma área de terra onde o gado era criado solto e
uma casa de adobe onde o vaqueiro morava, esse mesmo lugar é onde residem os moradores da
Cabeceiras do Rio. Seu Nivaldo continua morando no mesmo lugar (pág.22). Dona Nelci e sua família,
foram os primeiros a estabelecerem moradia no local onde hoje se concentram as casas da comunidade
Cabeceira do rio (pág.23). A família de Dona Verônica é a maior a residir no território, ela se mudou
com o seu marido seu Otácílio (falecido) após o lugar onde moravam ser vendido, a escolha pela
Cabeceira do Rio se deu em razão de sua filha já residir (pág.25). O senhor Guilherme é filho de dona
Verônica e casado com dona Déia, ele e sua família vieram morar no território, após a esposa ter um
AVC e a comunidade ter uma cesso mais fácil da cidade (pág.27). Dona Juvenilde, residia antes no
lugar de nome Ouro, e há cerca de nove anos resolveu mudar para a comunidade com o objetivo de
colocar os filhos para estudar, o lugar onde mora foi cedido por seu primo Zé Divino, que é casado
com uma das filhas da sra. Nelci, que já residia na comunidade (pág.29). Uma história de chegada mais
recente no território é a do senhor Leus e sua esposa Mariaci. Seu Leus vem sendo reconhecido pelos
demais moradores como uma liderança, e é também uma referência para lideranças de outras
comunidades. Ele é filho de seu Casemiro, que é um dos primeiros habitantes da região próxima a
Cabeceira do Rio (pág.30). Outro morador mais recente é o senhor Elcias, ele chegou no ano de 2013
e comprou um pedaço de terra de uma das famílias residentes no território (pág.31). Estes são os
principais relatos dos moradores de Cabeceiras do Rio sobre a história da ocupação do território.
Quanto a delimitação do território os moradores não sabiam precisamente delimitar, mas sabiam que
“aquilo tudo ali faz parte da Cabeceria” mas em termos de limites só conhecem com clareza os de seus
próprios sítios, pensar a Cabeceira como um todo foi para eles um exercício, que veio junto com o de
se pensar enquanto grupo (pág. 31). Foi possível identificar dois fatores que foram cruciais na definição
dos limites do território da Comunidade Cabeceira do Rio, o primeiro deles é continuar mantendo boas
relações de vizinhança com aqueles que acreditam que também tem o direito de morar na Cabeceira
do Rio (pág.33). o Segundo fator que foi esclarecido pelo próprio INTERPI foi que seria doado as
terras públicas e devolutas, as terras que tivessem com particulares seriam desapropriadas por órgão
federal (pág.33). A Comunidade Cabeceira do Rio, indicou alguns locais de interesse, dentre eles a
preservação das nascentes do Rio Uruçuí, a preocupação é com as queimadas que acabam por
prejudicar ao rio. Outro espaço destacado como de interesse da comunidade é a antiga área de moradia
do senhor Assis e de sua Mãe (pág.34). E como garantia de sobrevivência e de futuro tem interesse
pela área que fica a frente de suas casas do outro lado da BR 235, almejam a área tanto para cultivo
como para locais de moradia para seus filhos. A área onde concentram as palmeiras de buritis e
buritiranas também é objeto de interesse da comunidade uma vez que são importantes complementos
da renda dos moradores, como a venda dos frutos e da polpa do buriti e no caso da buritirana com a
venda da vassoura (pág.36). O local onde está localizado o cemitério da Comunidade também é alvo
do interesse dos moradores, uma vez que é onde estão enterrados seus familiares, ele fica localizado
entre a área das casas e o rio (pág.38). Outras áreas de interesse da comunidade são o brejo bebedor e
a fonte bebedor, utilizadas no passado para os animais e retirada da água para consumo das famílias
(pág.39). No que se refere ao Patrimônio Cultural da Comunidade, pode-se considerar também o modo
de vida sertanejo do sudoeste piauiense no qual retiram do meio ambiente tudo que é necessário à sua
sobrevivência, desde medicamentos à matéria prima para construção de suas casas (pág.40). Quanto a
relação de parentesco, a comunidade possui 22 famílias, e um total de aproximadamente 74 pessoas
entre adultos e crianças, não há preferência por casamentos externos e internos, mas é comum que se
casem com pessoas das comunidades próximas. A maior parte das famílias possui parentesco com
alguma comunidade próxima, tais como Melancias, Matas, Riacho dos Cavalos, Passagem da Nega,
os mais velhos inclusive migraram de algumas delas (pág. 44). Sobre a organização social e as formas
coletivas de organização política, social ou econômica, a comunidade não possui associações,
cooperativas ou agremiações. Um espaço de caráter coletivo decisório passou a ganhar forma no
movimento mais recente da luta pelo território, o que tem se dado concomitantemente com o
entendimento deles como um coletivo (pág. 55). No aspecto religioso a comunidade se identifica como
católica, não havendo construção de igrejas ou capelas, nem mesmo ruínas de tais construções. Não
foram mencionados lugares sagrados, nem identificadas falas que carregassem um caráter
cosmológico. Os moradores relatam que havia a celebração de uma missa que costumava acontecer
uma vez ao ano, em geral no dia 10 de maio. Atualmente o Festejo de Nossa Senhora da Conceição,
realizado no mês de dezembro, é o único acontecimento religioso na comunidade. Por ocasião da missa
anual, eram celebrados batizados e casamentos. Era comum que o padre seguisse por diversas
comunidades realizando um calendário de missas (pág. 56). Quanto as atividades produtivas,
econômicas e de subsistência, a maior parte das famílias tem a roça como principal atividade produtiva.
Em função do reduzido espaço de plantio, as roças não são muito grandes, em geral tem entre uma e
três tarefas (25 braças por 25 braças, a medida de uma braça é 2 metros e 20 centímetros), e o que é
produzido é para consumo próprio. Em geral os principais produtos plantados são: mandioca, arroz,
feijão, fava, milho, abóbora (pág.60). Outra atividade identificada foi a produção de mel de abelha
realizada pelo senhor João do Mel. Foi, também, identificada como atividade econômica a coleta de
lonas para a reciclagem feita pelo Sr. Elcias (pág.68). No que diz respeito ao acesso e uso de recursos
naturais, os moradores costumam obter a maior parte dos produtos necessários a sua sobrevivência do
próprio território. O acesso à água na atualidade se dá através de poços cavados à mão ou com
máquinas; no passado o mais comum era os poços cavados a mão, e além deles haviam as fontes de
água, como por exemplo o bebedor (pág.76). No que se refere ao envolvimento da Comunidade em
Políticas Públicas, os programas aos quais os moradores atualmente têm acesso são: Bolsa Família e
Benefício de Prestação Continuada (pág.77). Em relação a presença de empreendimentos na área
reivindicada pela Comunidade Cabeceira do Rio, foi identificada a rodovia BR 135, que atravessa o
território. Com exceção deste, não foram identificados empreendimentos instalados ou com previsão
de instalação na área da comunidade (p.78). No que refere à situação fundiária alguns moradores
possuem documentação da aquisição da terra em que vivem e trabalham, emitido pelo Cartório de
Registro de Imóveis de Gilbués, que é o caso por exemplo do sr. Leus, o Sr. João do Mel e o Sr. Elcias.
Os outros moradores que vivem no território não possuem qualquer tipo de documentação (pág. 78).
Em relação aos conflitos e à luta pela terra, nos últimos anos a área de terra localizada à frente das
áreas das casas da comunidade, do outro lado da BR 235, vem sendo vendida por aqueles que alegam
serem os donos da Terra (pág.78).
CONCLUSÃO E DELIMITAÇÃO: A delimitação de um território para a Comunidade Cabeceira
do Rio deve garantir as bases de subsistência e reprodução social, sendo assim o território deve ser
suficiente para atender a sustentabilidade dos recursos naturais presentes no território, considerando a
relação da comunidade com estes recursos. A relação da Comunidade com o território que reivindicam
está em constante construção, fruto das diversas dinâmicas que a eles se colocam, sejam elas naturais,
econômicas e/ou políticas, não se configurando assim como algo fixo, no entanto é presente em suas
falas o desejo de permanecer morando ali, e também seus filhos no futuro (pág.79). Foi possível
compreender a partir da fala oral da comunidade que a sua sobrevivência e permanência está
diretamente ligada à garantia de terra para suas atividades de cultivo e de criação de animais. Em várias
conversas houve a indicação de que a área que atualmente ocupam (mais especificamente os locais de
moradia) não é suficiente, demonstrando preocupação com o seu futuro e o futuro e seus filhos, que
não terão onde trabalhar e morar (pág.79). O território da comunidade parte da Boca do Baixão, na
Serra da Guariba, segue o contorno da serra em direção à ponta da serra da Azia, de lá segue em direção
ao pé da Serra da Buritirana, segue o contorno da serra do Veredão em direção ao pé da Serra do
Cantão, de lá segue em direção à cerca do Cantão, seguindo depois em direção ao Cantão na altura dos
buritis, de lá segue passando pela lateral da cerca do Sr. “Zé” Ramos, seguindo em direção à BR 235,
na altura da cerca do Sr. “Zé” Ramos (do outro lado da estrada), e segue em direção ao encontro
novamente da Boca do Baixão. A área identificada possui 3.138,9 hectares (pág. 80).
COORDENADAS DE REFERÊNCIA DO PERÍMETRO